quarta-feira, dezembro 06, 2017

despedida



São quase 7 anos. Tudo que era do seu tempo começa a se decompor. As camisetas. O computador. Meus cabelos. Os desejos. As máquinas têm uma destruição programada. Minhas células também. Sete anos. Qual célula tocada por você será a última a morrer? A curva da curva do pé? Uma presença sem corpo é uma memória, pronta para, dobrada, ser colocada na gaveta. Ou numa folha branca.

Te embrulho e coloco uma fita azul. Depois
pego a caneta e escrevo
aqui



sexta-feira, novembro 10, 2017

patuá




eu fiquei muito espantada quando me disseram que o espeto no vodu era para proteção porque eu sempre pensava em espetar o vodu na cara daquela vaca, e vi que não, então eu quis um bonequinho e tava andando na rua deslizando o sapato em dia de chuva vai que nem sabão e fui cai dei de cara com ele, o vodu, na vida a gente dá mesmo de cara com o que precisa, ou pelo menos com o que deseja, porque desejar fundo é precisar, e eu me levanto sem a ajuda de nenhum desse povo que passa só pensando em se proteger e pisa cinco corpos e sete estrelas sem saber de nada e então levanto sozinha e ajeito o vestido no corpo fazer o quê com a sombrinha escangalhada o que importa é o boneco na minha mão ele é você é o que ele disse quando falava de vodu Seu Zezinho que sabia de orixá e de ponto firmado na macumba. Valda, você ainda vai ser feliz ele dizia e sorria enquanto me pedia para chupar o pé de manga que dava ali no quintal.

Ora  se lá sou mulher de manga, eu dizia, mas o que importa é estocar o alfinete e eu sei lá qual  o lugar do corpo que mora minha fraqueza, porque se fosse de fraqueza já tinha rachado, mas tem uma coisa assim na garganta que vem quando penso longe e arfo o peito desanuvio no pensamento lembrando longe de você, que faz querer rachar os dois mundos o daqui e o outro para onde você foi então espeto a garganta bem no soluço que subia e que agora irá descer e deixo o boneco logo ali, caso algo trema na carne.

De alfinete é feita a saudade  


quarta-feira, novembro 01, 2017

g


ela treme
e sofre e
se apequena
se você
não souber
olhar
e então
(a olhando
por trás)
suas roupas
rasgam para
asas enormes
e negras
eu te amo
eu digo
para que ela nunca
se esqueça como
voltar

quinta-feira, outubro 19, 2017

árvore



Sendo 1/2 de minha família imaginada,


 é possível levar a vida sem senti-la

imaginária?





quarta-feira, outubro 11, 2017

movimente se



é tão bom quando
a máquina que molhou
e parou
volta à vida é

tão bom quando
escapamos
por um triz

como é denso
o senso de futuro
num dia bom 



segunda-feira, outubro 09, 2017

escrevo poemas


escrevo poemas
sem dar conta
de escrever romances a vida
é  um romance
meus versos
parecem prosa
sujos
de marcadores temporais
a melancolia
a nostalgia que todo autor
deve expressar
por olhos fundos confundidos
com profundos

Ah! Como quero escrever um romance
dominar
a forma a solenidade
sair da vida com a camisa
passada

Deixar o desalinho
de sentir tanto e ser
nada


terça-feira, setembro 26, 2017

cárcere


você já não
lembra a cor dos meus olhos a
aspereza do meu cabelo o sal
do meu corpo pegando teu corpo
no chuveiro vou perdendo os fios
que costuram meus braços no tronco a
particularidade do meu sorriso que
mostra um pouco da gengiva as covas
onde cabiam teus dedos
enterrados no meu rosto
não chegam flores
nem visitas
pior que morto
vivo
sepultado no que foi

você


terça-feira, agosto 08, 2017

autorretrato



não tenho amigos
nem poemas só
um tremor de que
tudo se acabou e
fiquei
aqui



genealógica



meu pai teve

6 filhos com

sete mulheres


deve ter sido

um cara de

despedidas


engraçado


não lembro de

meu pai ter

se despedido

de mim



quinta-feira, julho 27, 2017

noite




Desata a
gravata

mexe o braço
direito cotovelo
dobrado des-
dobrado

Vendo se
desaprendeu a
voar








terça-feira, julho 25, 2017

afins



Da areia olho meu corpo de
água
meio vazio o corpo
do mar
maré baixa
depois da cheia
o mar e eu somos e
não somos
a mesma coisa
então começo a te chamar
de mar
tudo aquilo que somos e
não somos
do mesmo



terça-feira, julho 18, 2017

corrente


 
Olho o mar
mediterrâneo
prestes a cumprir
mais uma vez
o olhar o mapa
fechar o zíper
mala nas costas
o último gole
na cerveja antes
do ônibus sair
penso em colocar palavras
na garrafa
mas do mediterrâneo
até você
quantos estreitos terá
que passar
será que você
será que você ainda
se põe
em mim?



terça-feira, julho 04, 2017

real



Diferentes lugares onde
o sultão
cuidadosamente escondia
e fodia
suas amantes
estão abertos
ao público por
10 euros

São lugares de mármore
e pedras
colunas adornadas e
mandalas na parede

Ontem publiquei memórias
travestidas de
poesia

10 euros é o preço
aproximado para
se abrirem
ao público

Não há só distâncias
entre
um poeta e
um sultão